quinta-feira, 29 de julho de 2010

Trilogia :: Política e seus mitos :: #2



Mitos #2

Hoje não quero falar de política como um todo, e sim de uma bancada em especial - a bancada evangélica. Interessante os processos que são pleiteados pelos potenciais candidatos e recandidatos às vagas como representantes do povo. Poderia mais uma vez falar de um modo geral, porém quero falar de um só mito em especial, e o mais repetido e usado como forma de convencimento nos discursos.

O mito: A cultura evangélica deve ser preservada politicamente e legitimada como tal.

Para justificar meu argumento faremos um breve passeio sobre o real significado das palavras e das intenções dessa sentença.

Em primeiro lugar não vejo como justificar ou contradizer essa frase sem fazer um recorte na tentativa de definir cultura. O que é cultura? Faço-te essa pergunta.

Para o primeiro a conceituar “Cultura”, pelo menos isso é aparentemente aceito entre antropólogos, Edward Taylor, 1871:

Cultura é o todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro de uma sociedade.

Taylor defendia que o homem era predominantemente cultural e isso era fruto da influência cotidiana do seu meio de vida. Segundo Roger Keesing:

Roger Keesing, antropólogo, em seu artigo "Theories of Culture" (1974), define cultura de acordo com duas correntes:
                •  As teorias que consideram a cultura como um sistema adaptativo: culturas são padrões de comportamento socialmente transmitidos que servem para adaptar as comunidades humanas ao seu modo de vida (tecnologias, modo de organização econômica, padrões de agrupamento social, organização política, crenças, práticas religiosas, etc.)
                •   As teorias idealistas da cultura são divididas em três abordagens:
                A primeira considera cultura como sistema cognitivo: cultura é um sistema de conhecimento, "consiste de tudo aquilo que alguém tem de conhecer ou acreditar para operar de maneira aceitável dentro da sociedade"
                A segunda abordagem considera cultura como sistemas estruturais: define cultura como "um sistema simbólico que é a criação acumulativa da mente humana. O seu trabalho tem sido o de descobrir na estruturação dos domínios culturais – mito, arte, parentesco e linguagem – os princípios da mente que geram essas elaborações culturais.
                A terceira abordagem considera cultura como sistemas simbólicos: cultura é um sistema de símbolos e significados partilhados pelos membros dessa cultura que compreende regras sobre relações e modos de comportamento.

O que acontece aqui é que temos que fazer uma pausa para examinarmos se cumprimos o primeiro requisito da frase mítica citada acima. Se Cultura, levianamente simplificando, é tudo aquilo que influência o sistema de vida de um indivíduo e faz com que ele se adapte e interprete esse sistema para, enfim, fazer parte e ser propulsionador da permanência dele. A pergunta que me fica na mente é: O evangelho é uma expressão cultural?

Acredito firmemente que não, se analisarmos pacientemente os detalhes do evangelho que Jesus nos deixou, perceberão que: o evangelho não é uma expressão cultural, ele é mais que acultural. Jesus em nenhum momento trouxe expressões de uma sociedade que estava sendo criada. Se você partir do princípio de que ele ensinou elementos de fé, deixou um mandamento e questões morais, isso são elementos que constituem uma cultura. Então é uma cultura? Se for se basear no princípio de Taylor sim, agora se for ao princípio de todo o complexo existente de hoje, diria:

1 - O evangelho de hoje não é o evangelho de Cristo.
2 - Sim, o evangelho de hoje é uma expressão cultural. Uma subcultura pertencente a um cultura maior do ocidente e, precisa de proteção. Por isso, a importância de se proteger essa decadente instituição com leis e projetos.

Explicando as partes:

1 - Existem dois evangelhos. Jesus não ensinou uma cultura como um complexo, um pacote de coisas. O evangelho era adaptado à cultura local. Por isso, falo que é mais que acultural, por que não é simplesmente uma fusão das culturas, o evangelho verdadeiro traz elementos que são moldados a qualquer cultura, somente alguns elementos morais ficam a ser definidos.

Prova 1:

- Jesus depois ir de volta aos céus deixa com os discípulos a responsabilidade de divulgar, como ele tinha feito, o Reino do Pai. Os discípulos começaram a fazer isso, com restrições, como eles eram judeus fervorosos tiveram algumas dificuldades em quebrar certos preconceitos culturais, por exemplo, falar com outros povos e aceitá-los na comunidade. Quando isso começou a ser feito sobreveio um enorme problema, o grupo de cristãos se dividiu. O primeiro grupo queria preservar a tradição judaica com a fé cristã, outro grupo acreditava que a fé cristã deveria ser acoplada a cada cultura singularmente. Isso ocasionou o primeiro Concílio Cristão, os maiores líderes vivos da época se reuniram e segundo o próprio texto diz, juntamente com o Espírito Santo, decidem:

Atos capítulo 15 trata do assunto, verso 29 traz a decisão final:
Que vos abstenhais das coisas sacrificadas aos ídolos, e do sangue, e da carne sufocada, e da prostituição, das quais coisas bem fazeis se vos guardardes. Bem vos vá.

Pronto, somente isso deveria ser preservado. O resto seria altamente adaptável à cultura local. Além da fé pura em Jesus, só isso deveria ser levado em consideração.

Prova 2:

- Paulo o homem responsável para levar a carta junto com outros mais, passa a viajar e ser um dos pioneiros a levar o evangelho aos outros povos. Basta ler cada uma de suas cartas e você percebe uma enorme contradição. Opa, você me pergunta contradição? Sim, pois em uma ele diz para as mulheres não falarem nas igrejas, em outra uma mulher é líder da igreja com seu marido. Em uma carta ele é altamente rigoroso, em outra diz que ninguém deve se importar com ordenanças. Em cada uma das cartas há direções diferentes, porém a fé em Cristo é vital e permanente em todas.

Porém, hoje é diferente. Entramos no ponto dois.



2 - Qual o evangelho de hoje e porque ele deve ser protegido.

Hoje o evangelho é um complexo cultural realmente, o crente hoje tem que necessariamente obedecer a itens como:

Vestuário
Em algumas instituições religiosas todas as pessoas usam roupas sérias e sociais, noutras líderes devem sempre usar gravatas. Nas mais moderninhas, o vestuário ainda sim tem conceitos puristas.
 
Linguagem
Desenvolve-se, como toda tribo e subcultura, uma forma de expressão da língua. Quem é evangélico entenderá esse tópico apenas pela expressão "evangeliquês".
 
Padronização de atitudes
Todos devem agir financeiramente iguais, todos devem agir e se manter em disciplinar preservando o condicionamento do todo e não das opiniões pessoais. Espera-se submissão e disciplina sem ao menos questionar.
 
Algo quase cientologista, e não realmente verdadeiro. Condicionada ao desejo pós-moderno, pseudocapitalista (pseudo, pois não preserva os elementos reais da teoria política capitalista, mais isso é assunto para outra hora).
 
Moral
Tudo que é fora da comunidade é imoral, independente do que seja tudo é "mundano", isso gera um etnocentrismo (mais isso é assunto do próximo e último parágrafo).
 
Diversão
Como tudo de fora é desprezado, gera uma necessidade de entretenimento dentro da comunidade, o que é aproveitado como um belo comércio. Tudo que é gospel é bom. Filme, música, teatro etc.

Uma cultura se fecha em comunidades assim, e claro nos moldes e caminhos do mundo atual nada tão ultrapassado conseguirá se manter vivo por muito tempo, assim a comunidade se fecha cada vez mais e se coloca como uma suposta "super cultura", estando assim acima de todas as outras formas culturais. Assim nasce o etnocentrismo, claro que as demais vertentes culturais vão repudiar essa cultura etnocêntrica e fazer de tudo para expurgá-la. Daí, chegamos aos nossos dias, onde uma cultura evangélica super fechada e etnocêntrica luta para ir ao poder legislativo para poder conseguir escrever leis e projetos que aumentam seus dias de doença terminal antes que as demais consigam terminar a última linha do seu epitáfio.



p.s: Mais à frente revisarei acrescentando novos elementos e referências complementares ao texto.




Abraço, boa tarde...\o









Referências:

2 comentários:

  1. É "Martinho Lutero"! Ops! Bruno Lobo..rs...Espero que quando a igreja pedir para vc se retratar vc não o faça...e q os que te apoiam preparem uma fortaleza para vc se abrigar e continuar a escrever...Concordo com vc e acho que a igreja deveria se importar mais com os problemas da alma, que são muitos por sinal. Um abraço.

    ResponderExcluir
  2. Mais um desabafo contextualizado. Gostei do ponto de vista "Martinho Lutero". Mas a realidade é que voltamos ao Feudalismo e àquele Concílio que separou as igrejas e as pessoas. Sempre as pessoas com os mesmos modos de pensar: política e religião sempre caminharam lado a lado. ;)

    ResponderExcluir